Que amor há no casamento?
Publicado em 14 de junho de 2012 às 20:59:48
O casamento em si possui um certo glamour. Como se o mesmo fosse o passaporte para a realização pessoal. Muito se sonha com o dia em que se há de casar. Mas ao se estar imerso nele, prova-se uma certa magia no início e no decorrer do tempo a magia vai a se esvair. Acaba o encanto, o outro já não é interessante, já não temos aquela paixão do namoro e nem mesmo do início do casamento. A convivência se torna cada vez mais difícil. Começamos a notar no parceiro comportamentos que não havíamos notado. Comportamentos que só se revelam ao se dividir o mesmo espaço. Tentamos a todo custo ignorar aqueles comportamentos percebidos, por um certo tempo o fazemos, mas não a longo prazo. Eles são constantes, incessantes, não há como fazer vista grossa. Iramo-nos, tentamos a todo custo mudar o parceiro. Queixamo-nos, às vezes, simplesmente nos omitimos e encerramos dentro de nós o grito silencioso do sofrimento. Estava tudo tão perfeito! O que tem ocorrido de errado? O que temos feito?
Estamos unidos, é uma união que separa, ninguém tem vontade própria. Andamos conforme as normas preestabelecidas por uma instituição chamada “matrimônio”. Essa instituição nos castram, castram nossa liberdade, nossos sonhos, não podemos mais ser, não há espaço para isso. Tentamos exercer o nosso poder sobre o outro e o outro também o faz conosco. É uma guerra, uma guerra de posse, uma guerra sem vencedores pois ambos os lados sucumbem ao sofrimento. O sexo já não é mais prazeroso, nos deixa feliz, mas é um felicidade estranha, parece faltar algo. Está a faltar algo, mas o que? O que falta se estamos aqui? Está tudo aqui! Temos construído juntos, temos tido filhos juntos, acumulamos posses. O que mais falta? Por que esse sentimento de revolta entre nós? E, por fim, nos entristecemos e simplesmente nos conformamos com a situação e dizemos conosco: “A vida é assim, não se pode ter tudo”; “Nada é perfeito”.
O que está a acontecer aqui? Em verdade digo que aqui dois seres lindos estão a morrer para a vida. Sepultam a si mesmos por acreditar que não têm escolhas. Que isso é tudo o que há. O que falta é o amor. Não há amor nesse tipo de instituição. Onde não há liberdade, não há amor, é impossível. Onde há cobrança, não há amor. Onde há julgamento, não há amor. Onde há desejo não há amor. Acreditas que amor e desejo andam de braços dados? Parece ser assim. Todo desejo precisa de um objeto, sem um objeto um desejo não existe. Estamos cercado de objetos por todos os lados, o mundo é um espaço objetivo e nele se encerram milhares de milhares de objetos e todos são passiveis de serem desejados. Viver em função de desejos é estar fadado ao sofrer, pois os objetos não tem nada a nos oferecer. Tanto mais grave é desejar alguém. Isso é violência! O outro não é um objeto. Tratá-lo como um objeto também é estar fadado ao sofrimento. Onde está o amor nisso? Por quê objetivar tudo? Larga o desejo! Já tens sofrido demais! Entrega-te a vontade! A vontade não deseja nada para ela. Ela não é objetiva. É a própria vida. A vontade afirma a si mesma e traz o belo para quem se entrega a ela. Desejar o outro não. Mas ter vontade de estar com o outro é diferente pois não se quer o outro para si. É se unir ao outro mas sem com isso querer tê-lo, é respeitar a individualidade dele, é respeitar a jornada dele. Isso é amor. Esse é o verdadeiro relacionamento, um relacionamento amoroso.
Aquilo a que chamamos de “matrimônio” está privo de amor pois se apoia sobre os desejos, sobre o ter o outro. Mas o outro é livre, divino e não temos direito de encarcerá-lo, de atá-lo a nós mesmos como se o mesmo fosse um animal de carga e por fim colocamos sobre ele duras regras e atamo-las a eles tanto quanto possível for ao passo que ao final ele mal pode se erguer sobre suas próprias pernas e como se isso não pastasse, tomamos-lhe as rédeas e ditamos os caminhos por onde deve passar. Ao fazer isso, acumulamos cargas sobre nós mesmo e somos também submetidos às mesmas rédeas e nos tornamos escravos dos nosso próprios atos. Como é que um relacionamento que se dá desse modo pode trazer plenitude? Esse é um relacionamento sadomasoquista que insistimos em chamar de amor. Onde se encontra o amor não podemos encontrar tristeza, angústia, solidão, ou seja, nenhuma espécie de sofrimento pode ser gerada onde está o amor.
O que falta no matrimônio? Simplesmente amor. Mas o paradoxo é que quando o amor repousar sobre o matrimônio, o mesmo deixa de existir, pois nada que prende ou separa permanece à luz do amor. A qual é fluídica, livre e não se deixa conter. No entanto contém tudo sem estar contido em nada.
Se tens medo da liberdade, não tome do cálice do amor, pois serás libertado de todos os seus desejos. Venham e bebam pois esse cálice está disponível a todos aqueles que está a faltar algo mais.